domingo, 25 de julho de 2010

Música

Difícil imaginar como seria nossa vida sem a música. Seria como extrair as cores do mundo, deixando tudo cinzento e entediante.

A música é um ser coberto de mistério e encantamento, sem corpo físico, etérea vibração que nos instiga e alimenta nossos mais profundos sentimentos. Ao mesmo tempo nos desafia o intelecto, nos faz perguntas sobre ela própria e sobre nós mesmos, perguntas que nem sempre estamos prontos a responder. Pois a música nos reinterpreta a cada instante; a nós humanos e a nosso tempo. Expõe abertamente nossas fraquezas, como se esperasse que uma culpa redentora pudesse transformá-las. Por outro lado, sabe como ninguém valorizar e preservar as virtudes, com que lhe impregnamos em momentos transcendentes de criação.

E são tantos, mágicos, intensos, apaixonantes, inebriantes momentos em dó maior, ou fá, si, ré... Cromáticos momentos, minimalistas ou tribalistas, etno-dodecafônicos, gregorianos ou balineses, contrapontisticamente intrincados, liricamente perfeitos, simplesmente divinos; momentos barrocos e pós-modernos, cristalinos ou eletrônicos... Momentos vividos no palco, na rua, na roda, no camarote ou na ladeira.

Momentos que hoje podemos guardar no bolso, para revivê-los quantas vezes nos der na telha. Momentos... assim como a vida, a música é feita de momentos, inscritos no tempo, efêmeros e fugazes, mas que felizmente podemos recriar.

A música é uma percepção do mundo. Sim, pois a música ecoa pelo mundo como uma presença obrigatória. A música é uma dimensão do mundo. Uma dimensão repleta de sentidos, significados, valores, ensinamentos, percepções... Uma dimensão que proporciona ao mundo uma beleza própria, uma beleza à parte. A música somos nós, traduzidos sonoramente, simbolicamente. A música não traz conceitos fechados, não existe no mundo visual, não possui o poder de representar nada de concreto. Como diz Oliver Sacks, a música não tem uma relação necessária com o mundo. Mesmo assim, o nosso mundo precisa de música. De boa música.

Podemos analisar o mundo através da música. Podemos dizer quem somos, ou quem julgamos ser, pela música que fazemos. Ela reflete nossos valores, crenças, sonhos, desejos... Como anda a música do mundo? Responder essa pergunta é dizer também como anda a humanidade. A música de hoje reflete uma humanidade superficial, consumista, hedonista, e tecnológica. É claro que existe um outro lado, mas ele parece cada vez mais isolado, mais distante do famigerado senso comum. É preciso educar o mundo através da música. Educar o mundo para a música. Educar o mundo da música e a música do mundo. Ela pode ser muito mais do que sons organizados. Pode revestir-se de uma verdade libertadora, conferindo uma perspectiva inteiramente nova à vida daqueles que se dispuserem a ouvir com um pouco mais de atenção.

A música oferece ao tempo a oportunidade de experimentar por um instante as infinitas alegrias e dores humanas. Transforma os ouvidos em órgãos vitais e lhes transfere o poder de perceber o tempo nos retribuindo e nos tornando imortais.

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